quinta-feira, 4 de julho de 2013

#37. Diários de bicicleta, dia 6: trigal marvado/The bike diaries, day 6: my heart´s not flat

[English version below ]

Dia 6
Burgos-Carrión de los Condes, 87km, 5 horas na bicicleta, e faz tanto silêncio que eu tenho vontade de gritar


Pedalo pela parte que é considerada a mais difícil para os peregrinos caminhantes. Sao 200 kms planos, plantaçoes de trigo, poucas árvores pra proteger do calor. Faz mais de 30 graus centigrados, solzao no ceu azul sem nuvens. Os caminhantes vao de cabeça baixinha, meio sofridos com a mochila, todo mundo no maior bronze bermudinha e t-shirt.

Quanto a mim, saio voando pelas plantacoes. Meu joelho está na vibe milagroso, nao sinto nenhuma dor. O vento sopra nas minhas costas, vai me empurrando, empurrando. Assisto a onda amarela levando o trigo, estou dentro da plantacao, minhas asas sao o proprio trigo seco e fazem aquele barulhinho fluc fluc fluc fluc.

Pedalo 5 horas sem perceber. Subo a 30km por hora sem nenhum esforço, mas me custa descer, tenho que pedalar forte pra chegar abaixo das encostas. Faz tanto calor que só falta uma daquelas caveiras de boi da caatinga, o asfalto se dissolvendo em miragens de deserto. Estou num filme do David Lynch, penso comigo.

Agora ja nao vejo mais ninguém caminhando, só as ruínas dessas milhares de cidades medievais que ficam por aqui. Pela primeira vez na viagem me sinto sozinha e nao consigo ultrapassar a sensacao. Paro pra comer um sanduiche em algum lugar perto de Castrojeriz, entro na igreja de Nossa Senhora de Manzano e choro, choro, aquele choro de gente entediada e triste sem razao. Saio, encontro dois ciclistas barbudos chegando, digo oi, e eles nem respondem.

Malditos road bikers.

Chego em Carrión-de-los-Condes e me abrigo num mosteiro de freiras. Mais silêncio, e entao tomo a decisao. Amanha vou pedalar desde bem cedinho pra chegar em Léon e sair dessa trigarada. Meu coracao é menos forte que meu joelho; nao nasci pra esse negócio de bonito em lugar-nenhum. Meus dias de Eleanor Rigby are over.

***

Flat ride. Miraculous painfuless knee, and I ride through the flat landscape of wheat plantations.

There's a golden light everywhere, the sun´s high in the sky, and I fly with the wind. 5 hours in the bike, and I don´t see the time passing by. Middle age cities, none´s around, the asphalt dissolving in front of me, and I feel I crossed some some of gateway into a David Lynch's movie.

I feel lonely for the first time since the beginning of my trip. At some point in Castrojeriz I stop by to have a sandwich, enter the church of Nuestra Señora de Manzano and cry for no reason, those tears of the lonely and bored people.

As I reach Carrión de los Condes I make a decision: tomorrow I will ride as fast as I can, all the way towards Léon, away from the golden silent plantations. I can stand a sore knee, but I can´t stand a sore, bored heart. I was not made for flat, plain beautiful, Eleanor Rigby timeless days.

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