sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

#59. Os diários da Índia: todas as formas de amor/ The India Diaries: all forms of Love





[English version below]


a mulher sentada na beira do caminho tem uma folha entre os lábios, e a vaca que se aproxima com a língua para tirar dessa boca a comida é abraçada com carinho depois do beijo
na sala de satsang uma pergunta surge com a voz do medo de morrer para encontrar conforto neste ensinamento que diz que há o amor se você se jogar do trapézio sem rede de segurança
são duas da tarde e uma família de porcos descansa ao sol ao mesmo tempo em que cabras e pessoas e crianças e cinzas de mortos e restos de plástico encontram seu caminho nas águas do rio Ganges
dois turistas americanos pechinchando as estátuas lindas do Buda que o indiano vende a 20 reais
na privada do meu hotel barato bóia uma camisinha usada e meio amarela dos antigos hóspedes
as buzinas de motos encontram a voz dos santos em alaranjado que cumprimentam seu Hare Om

: faz sol, e eu sentada com alguém num banco imundo      rindo desde um lado de mim        enquanto do lado avesso eu vou amando de um jeito diferente e tentando aprender essa coisa que a gente chama de Partida

***

she is sitting by the dusty path with a leaf in her mouth and the cow that is now approaching gets her warm hug after the lunch kiss from those human lips
the question crosses the satsang hall enveloped in the fear of death to find comfort in the teaching that promises love if you throw yourself from the cliff with no safety net
it's 2 pm and a family of pigs catches the sunshine at the same time in which goats and people and children and plastic bags find their way in the water currents of the Ganga
two American tourists bargaining in front of the beautiful Buddha statues that the Indian man is selling for 5 dollars
inside the toilet of my room sits a used condom from the previous guests
and this sound of motorcycle horns meeting the silence of the Babajis who greet us their Hare Om

it's sunny, and I'm sitting with someone in a filthy bench in the street        I am smiling from one of my insides for having the chance of loving in a different way        while from the other one I try to accept this thing we call Leaving

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

#58. Diários da Índia: residir no coração/ The India Diares: resident in the heart

[English version below]

Chego em Rishikesh.

Vou caminhando e vendo que estou no meio de um milhão de ashrams. Eles estão em todas as esquinas, tudo está em todas as esquinas porque tudo aqui é feito de labirintos, de becos, de curvas, de lugares escondidos       este lugar das esquinas
a cidade consagrada a Shiva, na beira do Ganges sagrado, aos pés dos Himalaias, a capital mundial da yoga, todos os gurus e todos os charlatões reunidos e cheio de gente e de vaca e de lixo e de esgoto e de sujeira e de brancos fazendo curso de yoga ayurveda meditação e sabe-se lá o que, porque também aqui é o mundo e essa vontade existe        às vezes     de comprar a iluminação     de arrancar a Verdade do pé pronta como se fosse um abacate ou uma jaca
então eu não entendo direito como é que assim       desse jeito       sem mudar nada     uma coisa pode ser também tão linda

então eu continuo caminhando, e de repente eu vejo o Mooji que vem na minha direção, caminhando com poucas pessoas em volta
ele é pequeno e parece um ursinho de pelúcia
eu paro, cumprimento
ele me chama, a gente se abraça e eu só consigo dizer thank you, Mooji, thank you, thank you
meu amigo chega perto dele, eles conversam, mas eu não tenho vontade
 eu estou tão feliz
acho que nunca fiquei tão feliz assim
se eu tivesse que pegar meu avião amanhã e nunca mais vê-lo, ainda assim eu estaria feliz

e essa incrível sensação de amor besta, o retorno para um lugar que parece minha casa, esta gratidão por encontrar residência no coração


*Este e o segundo de uma serie de posts escritos on the road sobre minha primeira vez na India, numa viagem que estou fazendo para estar na presenca do meu guru Mooji, em Rishikesh. E, portanto, mais um diario de aventura espiritual do que um caderno de viagens.
**Em gratidao ao querido Mestre, estes diarios sao dedicados a ele e aos amigos maravilhosos que, de uma forma ou de outra, me acompanham por aqui.

--------

In Rishikesh.

My legs take me for I walk, and all around me these ashrams, everywhere, in every corner, and this city is nothing but corners   encounters   dead ends   curves   hidden spaces   :the city of all corners

the sacred city dedicated to Shiva, by the holy Ganga mother, by the feet of the Himalayas, the world yoga capital, every guru and also every charlatan gathered together in unmoving peace. and people and cows and trash and western people taking all kinds of courses ayurveda meditation yoga whatever        because here is the world         and in it there is this strong feeling of attaining Liberation, so sometimes this urge expresses itself as "I want to purchase it now, please"      as if Freedom were this fruit we could get ripe from a tree   an apple   a mango    3 peaches.    and all this is also ok and understood

the joy fills me as I don't understand how          exactly the way it is     without changing any little thing         this Rishikesh can be so beautiful

thus I keep walking to suddenly catch a glimpse of Mooji who is coming in my direction, walking with almost nobody around him
he's small and his presence is a sun that invites embracing
I stop by, put the palms of my hands together and say hello, my face just a big smile
he calls me, hugs me, and I can say nothing but thank you, Mooji, thank you, thank you
my friend approaches him and they talk, but I don't feel like talking
I'm so happy, and this happiness now does not have space for words
It's happiness, I AM nothing but happiness
so I feel that even if I had to take the plane back tomorrow and not being able to see him again, even in this situation I would be the happiest creature on earth

: this incredible sensation of Love, the certitude of coming back Home, the gratitude for having found residence in the Heart

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

#57. Os diarios da India: nada de novo no front

Primeira posicao na minha lista de desejos desde sempre - la em cima, quilometros de distancia da segunda posicao. Por isso essa coisa inconsciente de pensa-la sempre como uma grande viagem. A Viagem Espetacular pela India Profunda, a Viagem Quintessencial, aquela que mudaria tudo, separando o tempo da vida entre o Antes e o Depois. Entao eu planejei que um dia eu iria, e li todos esses livros, e sabia tudo que eu faria muito antes da partida acontecer. (Minha cabeca, essa grande anti-viagem).

So que quando veio, veio assim: Ordinaria. Tao prosaica como pegar um onibus pra ir no mercado. Um dia o Mooji anunciou que ficaria um mes em Rishikesh oferecendo satsang para os discipulos. No meu coracao veio a vontade de ver o Mooji antes mesmo daquela vontade velha de India. Comprei um bilhete barato e voei ate Delhi. E e tao pertinho da Suica que eu fiquei sem entender porque nao tinha vindo antes.

Cheguei de madrugada, ontem. Assustadoramente normal, minha reacao foi de embasbacamento pela falta do Esperado. Nao me assustei com o transito, nem com a comida, nem com a pobreza, nem com o jeito de vestir, os barulhos nas ruas ou o cheiro onipresente, e nem fiquei achando tenebroso essa coisa das pessoas ficarem me olhando por eu ser branca e meio careca.

***

Acho que quando tudo e tao radicalmente estrangeiro, entender vira um pais distante. Da pra singrar as aguas turbulentas de interpretar e querer entender essa coisa que e completamente bizarra para todos os meus tipos de condicionamentos. Eu nem cheguei a tentar, e no primeiro momento foi reacao instantanea, e eu just let it go: passo a viver bem assim mesmo, sem entender nada. Tudo e fresco, nada me cansa porque eu nem me importo em saber o que significa. Sou uma tonga nas ruas de Delhi.

Melhor sensacao de leveza deste mundo, esta de encontrar um lugar onde a vida e surreal e taken for granted. Essa liberdade tao maravilhosa e excepcional que me faz sentir imediatamente em casa aqui em Delhi; a maravilhosa consciencia de me encontrar profundamente burra, quase nem sabendo quem eu sou.

Welcome to India, Mariana.

http://www.youtube.com/watch?v=uBqluZ5LieM


*Este e o primeiro de uma serie de posts escritos on the road sobre minha primeira vez na India, numa viagem que estou fazendo para estar na presenca do meu guru Mooji, em Rishikesh. E, portanto, mais um diario de aventura espiritual do que um caderno de viagens.
**Em gratidao ao querido Mestre, estes diarios sao dedicados a ele e aos amigos maravilhosos que, de uma forma ou de outra, me acompanham por aqui.