domingo, 30 de junho de 2013

#31. Bike diaries - Towards Santiago, day 1 - El Camino and its beginning

Day 1- 29 June, 2013
Irun-Beasain, 70km, 5hours on the bike, valleys and hills


After 1200km riding my bike from Brittany to the border with Spain, I came to the end of the trip and realized I had nowhere to live and nothing to lose, but I also noticed I had strong (and now suntanned!) legs and a good bike to ride. After having moved 9 times in less than two years, I felt it was time to stop resisting and to take my pilgrim lifestyle to a whole other level. This is the story of how  I cancelled my tickets to Brazil and decided to take my chances heading to Santiago de Compostela. These, and the followings posts, are excerpts from my personal diary. They will be published both in English and Portuguese whenever I have the chance, for I'm only in my second day and I have no idea when I'll find an internet connection again...

*Ramdom thoughts/situations in my first day of pilgrimage:

I will never make it in these fucking mountains.

I can't feel my knees anymore.

Why did I have to act hipster and choose a path to Santiago that nobody knows? Where the hell are the cute guys looking for enlightenment?
[ramdom thoughts in my day completely alone in the hostel in Beasain while thousands of pilgrims were fighting for a spot in the hostels throughout the French way, the most popular route to Santiago]

Ok. Everything has ham, I got it. So bring me the damn tortilla and a double dose of Jack Daniels on the rocks, please.
[vegetarian pain in Spain, properly cured with huge doses of Jack Daniels, after a heavy day riding my bike in the mountains]

Where are the cyclists pilgrims to Santiago?

Where are the women cycling on the roads?

I can't stand these stinky clothes anymore.
No way I'm wearing these socks again in my life.

What time does the siesta stop in this city?

-¿Hasta donde vas en bici, chica?
- Me voy hasta Santiago.
- ¿Y te vas sola?
- Sí!
-¿¿En serio???
- Si.
- !Valiente!
-.. y vengo del norte de la Francia, ya he hecho 1200km y algunas montañas...
-¡Valiente! Que buenas piernas tienes...
- Gracias. Ahora dejáme, que necesito continuar.Que te vayas bien, chico.
[my usual, daily dialogue with professionalroad bikers that come along in the road to chat while I'm riding. with my 10kg panniers. I swear: this dialogue happens more than 10 times a day, but none of the guys is riding to  Santiago, so none of them can make me company for too long]

No... ¿Tú? En bici? Sola? Hasta Santiago? Mira, que nunca he visto eso!

Please, God, no rain tomorrow, please please please...

Please, God, no steep mountain tomorrow, please please please...

Can I borrow some ice to put on my knees?
[in the bar]

What do you mean by me crossing the Pyrennees, sir???





Thanks, God, for I've never been so happy.

#31. Diarios de bicicleta, dia 1 - de onde começa El Camino


Dia 1
Irun-Beasain, 70km, 5hs de pedal, montanha e vale

Era ontem, dia 29 de junho deste nosso calendário cristao e largada da centesima edicao do Tour de France, e eu começava meu primeiro dia de peregrinaçao em bicicleta a Santiago de Compostela. Deixei o albergue em Irun, no País Basco, às 7 da manha. Up!, mapa na mao e me perco na primeira quadra, onde estao estas malditas flechinhas amarelas que indicam o caminho hasta Santiago? Pronto, encontrei, aí está, agora sou eu na trilha para pedalar 4 minutos e logo descobrir que realmente o lugar onde caminham os peregrinos é impassavel para os ciclistas. A peregrinacao em bike é diferente,algumas vezes pelo caminho, outras por estradas alternativas que você mesmo tem que procurar no mapa. (E a Espanha é maravilhosa, mas definitivamente nao é a Suíça das ciclovias...). Ladeira acima, desço da bicicleta, caminho uns 5 quilômetros entre meia dúzia de pereginos que apontam para mim em todas as línguas, que diabos esta ciclista bizarrona esta fazendo?  Pois bem: esta sou eu, caminhando morro acima e levando no braço uma bicicleta carregada com 10kg, morrendo de medo do pneu furar neste vale de pedras pontudas, a sapatilha de ciclista enfiando fundo no lamaçal, aquela cara de quem odeia existir antes das 9 da manha.
"Que inferno este caminho; onde caralhos fui me meter?": aí estao minhas primeiras impressoes sobre esta mistica peregrinacao.
5km assim, e eis que encontro uma estrada alternativa cortandoa trilha no meio do nada - ah, a paz do asfalto, vivam as road bikes!  Saco meu mapa e meu espanhol ruim e abordo o velhinho pescando no riacho no meio do Lugar-Nenhum - señor, como llego yo hasta Hernani? De ruela no meio do nada a estradas nacionais, às 8 eu já sentia meu pobre joelhinho enquanto subia as montanhas infinitas até Oiartzum and beyond, e 70km depois eu chegava no albergue dos peregrinos em Beasain.
Sao 2:30 da tarde. 50 camas, nenhum peregrino. Mariana, a hipster do Caminho, resolveu escolher uma rota indie para começar a viagem. Em vez do Caminho do Francês, a rota preferida dos peregrinos gatinhos internacionais descolados caminhando em busca da iluminaçao, decidi começar pelo Caminho do Interior, um trecho que vai de Irun até Santo Domingo de la Calzada, e que simplesmente ninguém - repito: nin-guém - conhece.
"Onde caralhos fui me meter?"
---
Faço meu registro no albergue, minha voz ecoando no nada de ninguém de lugar nenhum. Dois velhinhos voluntários me registram, sentam comigo, me mostram no mapa o tanto de rodovias e desvios que vou ter que pegar no dia seguinte. "Es muy duro para los ciclistas, no hay nadie en bici en eses lados."
E eis que chega Antonio, o responsavel pelo albergue. Foi ele quem criou este lugar lindo, no meio da rota do interior, sem preço - você paga em donativos. Uns 60 anos, normal, sandalias, ele fez o Caminho mais de 20 vezes, de todos os jeitos possíveis. Está empolgadíssimo porque em 26 dias vai fazê-lo de novo, combinando milhares de percursos diferentes. Mas nem fala sobre isso, nao está interessado nas minhas 257.432 perguntas que giram em torno da pergunta-base como é o caminho? Em vez de responder ele spluft, vê minha pobre bici esfarrapada, acha lindo uma lulher sozinha pedalando o caminho, diz que nunca viu isso, sai correndo, pega o carro e lá de dentro grita "vamos!", me enfia no banco do passageiro falando num espanhol meio basco que eu entendo mais ou menos, e vai subindo, subindo, uma rodovia estreitinha de mao dupla que serpenteia no meio da floresta, uns 40 minutos, e eu vou sentindo uma crescente e quase incontrolável vontade de vomitar porque ele sobe aquelas encostas correndo, tudo chacoalha dentro daquele carro, está ficando alto demais muito rápido, what the fuck... "Mira: es en esa carretera que tienes que subir mañana. Vas hacer ese camino mañana, ¡no te pierdas!"
Meu Jesus.
Ele estaciona o carro no meio da floresta. O dia está lindo, e vamos caminhando montanha acima. Vejo um cavalo com um cavalinho bebê de uns três dias e tenho vontade de chorar. Chegamos. Aí está: uma caverna com uma igreja dentro. Uma fenda, e para continuar o caminho é preciso abaixar até o outro lado. Abaixamos. Atravessamos. Um tapete de pedra e grama,o topo da montanha. Caverna de San Adrian, uma das coisas mais lindas que eu já vi na vida.
Ele sabia que eu nao podia chegar de bici, o dia estava lindo e ele achou que eu devia ver com meus próprios olhos.
Continuei perguntando do Caminho enquanto descíamos. "Ya no sé yo lo que es lo Camino. Cada uno hace su Camino; el Camino es el tuyo. Y él no empieza aquí: empieza cuando saliste de casa para hacerlo: ahí empieza tu Camino".
Muchas Gracias, Antonio.
---
Entao, para resumir, foi assim:
Eu saí no dia 14 de junho para fazer uma viagem de bici com minha companheira de esportes. Carol e eu pegamos um trem até a Bretanha, no norte da França, e pedalamos 1200km até a fronteira com a Espanha, a maior parte do tempo com um amigo irlandês que conhecemos na estrada. Chegamos, eu nao vi sentido em voltar - afinal de contas, já nao tenho mesmo casa em lugar nenhum.
E como estávamos a 5km de uma cidade-base para o caminho de Santiago de Compostela, remarquei minha passagem pro Brasil e decidi continuar até Santiago.
A história do meu Caminho, naquilo que der, eu vou contando aqui, quando der. Copiando do meu diário de viagem, sel elaboraçoes... Porque afinal de contas, eu estou no dia 2, e afinal de contas, nem internet, nem smartphone, nem nada. Thanks God eu ainda tenho meus joelhos. Mais ou menos.
----
Entao rezem por mim nas encostas das montanhas.
 
Aqui está a página do facebook do albergue do Antonio:
https://www.facebook.com/albergue.debeasain?ref=ts&fref=ts

E a trilha sonora para uma ecumenica hipster mistica peregrinando em busca da iluminacao:




E eu prometo que vou contar melhor, inclusive minhas impressoes da viagem com a Carols, quando voltar pra vida normal - nao posso nem copiar meu diario daqueles dias, porque perdi o caderninho onde estava anotando as coisas num dia que a bici estragou na chuva...
Ainda nao comprei camera, entao, torçam ai pra Carols postar as fotos ou para eu encontrar uma lojinha de fotografia aberta fora do horário da siesta.

Buen camino, compañeros!

******

segunda-feira, 10 de junho de 2013

#30. Desligue o computador e ligue algo diferente/Turn off your computador, plug in something different

[English version below]

Qual foi a última vez que você passou dois dias sem entrar a internet?
Quanto tempo você já conseguiu passar longe da tela do computador ou do smartphone?
Pois amanhã eu vou pra Paris sem computador. Saio pra pedalar 1200km dentro de 4 dias pelo interior da França. A expectativa é passar 19 dias sem computador, pedalando e lendo "La Force de l'Âge", da Simone, checando email de vez em nunca no celular da minha companheira de viagem.

E a sensação de não ter essa conexão de internet não me deixa mas leve. Ela só é estranha e me dá medo, como se eu perdesse algo que fizesse parte de mim e sem a qual eu não conseguisse viver.
Talvez seja hora, eu digo pra mim mesma, de encontrar outras formas de fazer minha conexão com o mundo.
***
What was the last time you spent 2 days without checking the internet?
What was the longest period that you managed to spend away from your computer or smartphone?
So tomorrow I'll head back to Paris without my computer. I don't even have a smartphone. Putting together the preparation and the 1200km bike ride throughout France, I will be away from the computer 19 days in total. I expect to read Simone de Beauvoir's"La Force de l'Âge", which I'm happily carrying in my bag with me.

But the sensation of not having this internet connection doesn't make me feel lighter. It makes me feel weird and afraid.
It is probably time for me to reinvent new forms of connecting the world.